QUAL A ORIGEM DA PALAVRA "SANTARÉM"?
por Silvan Cardoso
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| Imagens: Reprodução |
Quando Francisco Xavier de Mendonça Furtado, então governador da província do Grão-Pará, elevou a aldeia dos Tapajós à categoria de vila em 14 de março de 1758, batizou-a com o nome “Santarém”. Mas o nome não foi criado ou escolhido por acaso.
É bastante comum ler textos ou assistir aos vídeos em que se afirma que
esse topônimo é de uma cidade de Portugal, que foi “homenageada” por Mendonça
Furtado, ao trocarem o nome “selvagem” Tapajós pelo nome “civilizado” Santarém,
vindos desses lugares portugueses, até então os colonizadores do Brasil.
Entretanto, o que realmente significa a palavra “Santarém”? Como teria sido a sua origem?
O relato mais conhecido é de uma história - ou lenda - vinda do século VII, uma época bem distante, em Portugal.
Iria, filha de
ricos, serva de Deus

Tomar, antiga Nabância, cidade portuguesa onde nasceu Iria ou Irene.
Na antiga região de Nabância, atual cidade portuguesa de Tomar, morava o
casal Hermígio e Eugênia, católicos da nobreza, que tiveram uma filha, chamada
Iria (ou Irene), que teve uma boa educação, nas boas condições financeiras em que vivia.
A jovem tinha uma beleza que chamava a atenção de qualquer pessoa,
encantando muitos homens. Assim que alcançou a idade ideal, Iria entrou num
convento beneditino, pois seu desejo era ser serva de Deus. As suas instruções
ficaram na responsabilidade do monge Remígio.
Longe do que acontecia do lado de fora do convento, era raro Iria sair
de lá. Mas em todo dia dedicado a São Pedro, ela saía até uma igreja desse
santo na companhia de suas tias Casta e Júlia, irmãs de seu pai Hermígio. A
igreja ficava junto ao palácio de Castinaldo, governante da região.
Castinaldo tinha apenas um filho, chamado Britaldo, que frequentava a
igreja de São Pedro e que, segundo algumas versões, era compositor de trovas
para o referido templo religioso. Numa de suas idas ao lugar, conheceu a jovem
Iria.
Paixão doentia pela religiosa

Representação artística de Britaldo, herdeiro da Nabância.
Britaldo encantou-se tanto pela religiosa, que ficou apaixonado de uma forma
descontrolada. Tanto se apaixonou perdidamente que adoeceu e ficou de cama em grande
desespero, por essa paixão que o consumia por dentro. Chamava com frequência pelo
nome de sua amada.
Versões da lenda afirmam que Deus teria comunicado à Iria sobre seu
apaixonado, que estaria se entregando à morte, por achar que se encontrava numa
situação terminal de tanto amá-la. Dessa forma, a jovem resolveu visitá-lo.
Vendo-o doente, Iria tranquilizou-o com suas sábias palavras, afirmando
que sua doença não era mortal, e que Deus logo recuperaria a sua saúde. Mas
também foi sincera a ele: não tinha pretensão de se casar com ninguém, apenas
de servir a Deus.
Britaldo foi consolado pelas palavras de sua amada e se recuperou da
enfermidade que sentia. Seus pais, como forma de agradecimento, colocaram
ofertas na porta do convento onde Iria morava.
Sob os desejos e vingança de um monge

Uma das representações artísticas da morte de Santa Iria.
A religiosa precisou lidar como outra situação, mais preocupante ainda:
seu tutor, o monge Remígio, também se apaixonou perdidamente por Iria. Aquele que
deveria ser de confiança demonstrava outros interesses.
Da mesma forma que ela se negou a Britaldo, Iria negou-se ao religioso.
Mas ele foi mais rigoroso e não aceitava a decisão dela. Tinha um ciúme doentio
e não conseguiria aceitar um “não” facilmente.
Diante da impossibilidade de tê-la como mulher, tomou uma atitude
vingativa: fez com que ela tomasse uma bebida contendo uma poção. Assim que ela
bebeu, sua barriga inchou tanto, que parecia estar grávida.
Quando a viu naquela situação, sua superiora determinou a sua expulsão
imediata do convento, justificando que Iria teria quebrado os votos de
castidade por conta da aparente gravidez.
A morte de Iria

Representação artística de Britaldo matando Iria.
Depois que saiu do convento, a religiosa ficou à margem do rio Nabão,
onde permaneceu em orações. Esse rio banhava a região de Nabância.
Britaldo já estava melhor de saúde. Porém, assim que viu a sua amada
“grávida”, não conseguiu aceitar a “traição” que ela tinha causado, por conta da sua barriga ainda inchada.
Há duas versões sobre a morte de Iria. Uma delas diz que Britaldo teria
mandado um criado matá-la na margem do rio. A outra versão diz que ele mesmo
causou a morte dela.
De um jeito ou de outro, na história se lê que a religiosa foi assassinada e seu corpo jogado nas águas do rio. De acordo com relatos, Iria morreu virgem, com aproximadamente 18 anos, possivelmente no ano 653 d.C.
O corpo dela foi levado pelas águas, alcançando o rio Zêzere, até chegar
no rio Tejo. Viu-se um rastro de sangue desde o rio Nabão, que serviu para
localizar o seu corpo que, de forma milagrosa, foi encontrado em estado
perfeito de conservação depois de um tempo.
Surgem o nome “Santarém”

Representação artística de Santa Irene (ou Santa Iria), que dá origem ao nome "Santarém".
O corpo da jovem Iria foi encontrado nas proximidades da cidade de
Scallabis. Por conta do corpo perfeitamente preservado, tratou-se aquilo como
milagre e surgiu uma grande devoção por aquela que passaria a ser chamada Santa
Iria ou Santa Irene.
A cidade portuguesa de Scallabis passou a ter o nome da santa por ter
sido lá o resgate do seu corpo: cidade de Santa Iria ou cidade de Santa Irene.
Muitas versões textuais afirmam que a cidade se chamava Scallabis quando
foi fundada, provavelmente no ano de 138 a.C. Com a dominação romana na região,
teria se chamado posteriormente de Praesidium Julium.
Com a soberania visigótica, a cidade portuguesa se chamaria Sancta Irene
(ou Iria), já homenageando a santa do relato que foi contado neste texto. Com a
invasão mulçumana no século VIII, foi chamada de Shantarin. Já com a
reconquista por d. Afonso Henriques, em 1147, veio a atual denominação
Santarém.
Versão de Wilde Fonseca

O livro de Wilde Fonseca faz um breve relato da história de Santa Irene.
O estudioso Wilde Dias da Fonseca, de Santarém do Pará, escreveu sua
versão sobre a origem da palavra Santarém, em que o nobre que se apaixonara por
Iria (ou Irene) era chamado de Teobaldo. Ele ainda teria pedido a sua mão em
casamento, que foi logo negado.
Na narrativa de Wilde, Teobaldo teria raptado a religiosa. Quando ela o
negou novamente, enfureceu-se e a degolou, jogando seu corpo no rio Nabão. Com
seu corpo encontrado intacto em frente à cidade de Escalabis, um túmulo de mármore
alvinitente foi construído em sua memória.
Mais tarde, a cidade seria chamada de Santa Irene, pronunciada pelos
lusitanos de Sant’Irene. Com o tempo, chamar-se-ia, enfim, de Santarém, cidade portuguesa e que, no século XVIII, o nome
que seria designado para a atual Santarém paraense, no meio da floresta amazônica.
Fonte:
·
Santarém: Momentos históricos (Wilde Dias da Fonseca –
Instituto Boanerges Sena – Santarém, 2015);
·
https://bercodomundo.com/2025/04/santarem.html (acessado em
12/11/2025);
·
https://feirasantairia.pt/index.php/2022/09/29/lenda-santa-iria/
(acessado
em 12/11/2025);
·
https://heroinasdacristandade.blogspot.com/2014/10/santa-iria-de-tomar-virgem-e-martir-20.html?m=1 (acessado em
12/11/2025);
·
https://www.visitesantarem.pt/historia/ (acessado em
12/11/2025).

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